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O CROCODILDO foi o maior projeto em que já me meti até hoje.

O primeiro contacto que tive com o hip hop foi através do João (A.K.A. Pryde), um dos meus grandes amigos, que conheci no secundário, na Portela de Sintra. Todos os dias eu entrava no bus que me levava até à escola, o 441, e ia-me sentar ao lado dele no último banco do autocarro. Foram nessas viagens que começámos a falar sobre tudo, muitas vezes cheios de sono, e onde partilhávamos phones todos os dias. Eu ouvia muito mais Arctic Monkeys, Tame Impala e outras bandas de rock alternativo nessa altura, e numa das viagens o João mostrou-me um som do Sam The Kid e eu percebi a essência daquilo que era o estilo de música favorito dele. À medida que estes 3 anos passavam fomos explorando cada vez mais este género e partilhávamos álbuns favoritos. Entre inúmeros discos que iam ganhando ou perdendo a nossa atenção, a mixtape 1999 do Joey sempre ficou e ainda hoje nos enche de nostalgia quando a ouvimos juntos.

Um dia, enquanto esperávamos na paragem do 441 na estação da Portela, veio à conversa a ideia de eu criar música. Lembro-me de ter dificuldade em imaginar-me a rimar um som todo sério sobre a vida, e veio-me a ideia de fazer música misturada com humor. A ideia era pegar em temas que queria explorar de forma humorística a rimar em cima de beats da internet. Fui amadurecendo esta ideia mas pensei que se fosse eu a fazer os instrumentais das músicas todo o projeto acabaria por sair mais pessoal e original. Então decidi aprender a produzir. Em Junho de 2016 comprei um teclado midi e comecei a fazer beats.

Dediquei-me a esta aprendizagem durante vários meses e descobri que é uma coisa que me divirto mesmo a fazer. Quando senti que já tinha beats suficientemente bons, comecei a escrever as músicas, mas foi um processo que deu muitas voltas. Em Março de 2017 lancei a MILF. Em Maio lancei o segundo single, EPIDEMIA. Em Setembro a COTA, na qual o João tratou do segundo verso, e em Dezembro saiu cá para fora a ALGUÉM. Logo a seguir, lancei o álbum completo, que contém 13 faixas que abordam vários temas sempre sob uma perspetiva humorística mas crítica e reflectiva ao mesmo tempo. O meu objetivo com o disco era criar algo novo, diferente, algo que eu gostava de ver alguém a lançar. E sinto que foi missão cumprida, apesar de todo o stress envolvido na criação que adveio da minha maneira obcessiva de fazer o que quero. Aprendi imensas coisas, desde a produção musical, passando pela mistura (que foi feita pelo Charlie Beats, comigo sentado ao lado, durante uma eternidade de horas de estúdio passadas a rir, a conversar e a trabalhar) até à performance em palco e, no geral, sinto que desenvolvi bastante o meu potencial criativo.

O mais importante de tudo foi a minha mudança de perspetiva em relação às coisas que crio. Fartei-me de criar conteúdo humorístico sem grande profundidade que, embora bem conseguido (digo isto mas sempre que vejo um vídeo antigo começo a coçar-me todo de vergonha e embaraço), não era material de reflexão que pudesse mudar grande coisa. O CROCODILDO apanhou-me nessa fase e sinto que me ajudou a retirar essa casca velha e crescer.